Não há certezas absolutas de quem partiu a ideia da
criação da primeira Misericórdia em Portugal, nem isso é relevante. Certo é que, no dia 15 de Agosto do ano de 1498, em Lisboa, nos claustros da Sé, na Capela da Nossa Senhora da Piedade,
designada também por Nossa Senhora da Terra Solta, foi fundada a Irmandade da Misericórdia de Lisboa, a qual serviu de modelo e inspiração à criação de instituições congéneres em várias cidades e vilas de Portugal, do Brasil e em outras partes do mundo aonde os portugueses iam chegando.
Como referiu o Conde de Sabugosa, não é muito importante saber-se se a criação se deve ao monge ou à Rainha, «porque os dois corações generosos e caritativos não disputaram primazias, entrando cada um para a empresa com os elementos de que dispunha. Ele com a sua inteligência organizadora, actividade incansável e paixão ardente. Ela com a sua muita piedade e influência e aquela generosidade que a levava a aplicar às instituições que protegia, as rendas próprias e os bens que obteve de mercê real».
1.1 - A Pré-Misericórdia de Tondela
Foi precursora da Santa Casa da Misericórdia de Tondela, uma Associação Filantrópica designada por Sociedade de Beneficência de Tondela, fundada em 24 de Abril de1897, por iniciativa de Inácio Pereira do Vale, com o objectivo de construir um Hospital para os doentes pobres do concelho.Para que conheçamos melhor aquilo a que poderemos designar por génese da Misericórdia de Tondela, não resistimos em transcrever aqui o que o ilustre tondelense, Dr. Amadeu Ferraz de Carvalho escreveu em 1908 numa brochura intitulada "Hospital do Concelho de Tondela em Construção":
«Partiu a iniciativa do saudoso tondelense, Ignácio Pereira do Valle, homem duma bondade imperiosa e comunicativa, a quem a prática espontânea, constante, sem desfalecimentos de acções generosas, sempre norteada por um são critério moral, era imposta como que por uma necessidade constitucional da própria natureza. Amando como ninguém a sua terra, tendo uma perfeita intuição das suas necessidades e vivamente condoído pelos horrores com que a doença agrava a triste condição das classes mais desfavorecidas, soube congregar em volta de si um grupo de conterrâneos e de pessoas de família que desde logo compreenderam o alcance e viabilidade do seu plano e viram que a sua execução, uma vez posta em começo, certamente seria ajudada por boas vontades dispersas e caridosas intenções
entorpecidas que o exemplo do seu esforço e tenacidade não deixaria de estimular e atrair a uma acção comum.
A primeira reunião da Assembleia Geral da Sociedade de Beneficência de Tondela teve lugar do dia 30 de Maio de 1898 e, em 16 de Julho do mesmo ano, reune, pela primeira vez também a Direcção, para a distribuição dos cargos, tendo sido eleito presidente o Padre Ignácio Pires de Mello.
De referir que esta grande benemérita, falecida em 1903, lega ainda em testamento, a avultada soma de dois contos de réis para a Sociedade.
Em 1915, no dia 18 de Julho, é inaugurado o belíssimo (ainda hoje) e moderno (então) Hospital do Concelho de Tondela, o Hospital de Santa Maria, que se manteve em funcionamento até à inauguração do novo Hospital, em 4 de Setembro de 1955.
Este é um belo exemplo de como a solidariedade humana e a preocupação com os mais desprotegidos, pode vencer os maiores obstáculos!
Porém, sabe-se que se não é fácil construir um estabelecimento deste género, mais difícil é ainda assegurar o seu funcionamento, sobretudo quando os seus serviços são dirigidos àqueles que pouco ou nada podem pagar, e não recebe qualquer contrapartida do Estado. Foi assim a necessidade de sobrevivência do Hospital com ajudas estatais que levou o presidente da Comissão Administrativa da Sociedade de Beneficência de Tondela, Dr. Jerónimo Lacerda, a propor a transformação da Sociedade numa Misericórdia, atentos às grandes vantagens que a estas Corporações são hoje concedidas pelo Governo, em harmonia com o disposto no Decreto número 15809, publicado no Diário do Governo de 2 de Agosto de 1928.
A Assembleia Geral de 28 de Setembro de 1929, presidida pelo Dr. Eurico José de Gouveia, foi apreciada a proposta de transformação apresentada pelo Doutor Jerónimo Lacerda, com a qual a Assembleia Geral concordou e encarregou a Comissão Administrativa de elaborar os Estatutos da Misericórdia.
Apesar desta deliberação, só em 2 de Maio de 1952, 23 anos mais tarde foi apresentado e aprovado o Compromisso da Santa Casa da Misericórdia de Tondela, pela Comissão Administrativa do Hospital de Santa Maria.
Foi ainda em vida da Sociedade de Beneficência de Tondela, que a Comissão do Hospital de Santa Maria, presidida já por António Rosa Fernandes Pinto, adquiriu um edifício no Caramulo para transformar em Sanatório, destinado ao tratamento dos tuberculosos pobres do concelho, pela quantia de 230 contos. Para o efeito foi concedido em 1951, um subsídio do Ministério do Interior na importância de 130 contos. Este estabelecimento passou a designar-se por Casa de Saúde Fonte dos Castanheiros, situado em Paredes do Guardão, (ou Enfermaria-Abrigo do Hospital de Tondela) num lugar ainda hoje paradisíaco. Grande parte do mobiliário para este Sanatório foi oferecido por vários Beneméritos. Foi inaugurado em 20 de Abril de 1952, pouco tempo antes da criação da Misericórdia.
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